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Cessar-fogo em Gaza: ação de Trump foi decisiva para acordo, mas ainda está longe de garantir processo de paz

  • 15 de October de 2025


  • O presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, disse que este momento é um "amanhecer histórico de um novo Oriente Médio" EPA/Shutterstock A rápida viagem do presidente americano, Donald Trump, a Israel e ao Egito nesta segunda-feira (13) foi a consagração pessoal que ele buscava. Qualquer um que assistisse aos discursos que Trump fez em Jerusalém e em Sharm el-Sheikh, poderia ver um homem se deleitando com seu poder, aproveitando os aplausos no Parlamento de Israel e no Egito, aproveitando a presença de tantos chefes de Estado e de governo. Um diplomata veterano presente afirmou que parecia que Trump via os líderes mundiais como figurantes em seu próprio set de filmagem. Em Sharm el-Sheikh, no Egito, a mensagem que o presidente americano queria transmitir era clara: a de que ele conseguiu uma virada histórica. "Tudo o que fiz na vida foram negócios.

    Os maiores negócios simplesmente acontecem… Foi o que aconteceu aqui.

    E talvez este seja o melhor negócio de todos", disse. Os observadores podem ter tido a impressão, pelos discursos, de que a missão estava concluída.

    Não está. Trump discursa no Egito e diz que agora começará a reconstrução da Faixa de Gaza Trump, sem dúvida, pode reivindicar crédito pelo acordo de cessar-fogo e pela troca de reféns.

    Catar, Turquia e Egito usaram sua influência sobre o Hamas para obrigar o grupo a aceitar o acordo. O esforço foi conjunto, mas o papel de Trump foi decisivo. Sem a pressão de Trump para exigir que o primeiro-ministro israelense, Benjamin Netanyahu, aceitasse termos que ele próprio havia rejeitado anteriormente, o acordo não teria sido assinado. Isso ajuda a entender do que trata o acordo — e do que ele não trata. O acordo prevê um cessar-fogo e a troca de reféns por prisioneiros.

    Não é um acordo de paz, ou nem mesmo o início de um processo de paz. A próxima fase do plano de 20 pontos de Trump exige um acordo que complete a estrutura prevista, na qual a Faixa de Gaza seria desmilitarizada, protegida e governada por um comitê que inclua palestinos. O projeto prestará contas a um Conselho de Paz presidido por Trump.

    É necessário um trabalho detalhado e intenso para que essa etapa seja implementada. O acordo sobre Gaza não é um roteiro para a paz no Oriente Médio — o destino final que parece, pelo menos até agora, inalcançável. O primeiro-ministro israelense, Benjamin Netanyahu, chama Trump de "maior amigo que Israel já teve na Casa Branca" REUTERS Além disso, não há evidências de uma vontade política de Israel e do Hamas para alcançar um acordo de paz real.

    A maioria das guerras termina com beligerantes exaustos firmando algum tipo de acordo.

    A guerra em Gaza se tornou uma delas, se é que, como Trump declarou, ela realmente acabou. A outra maneira de encerrar uma guerra é com uma vitória total, que deixa os vencedores ditarem o caminho a seguir.

    O melhor exemplo é a rendição incondicional da Alemanha nazista em 1945. Antes de 9 de setembro, quando Netanyahu ordenou um ataque com mísseis ao Catar, ele parecia ainda estar decidido a esmagar o inimigo de Israel de forma tão abrangente que Israel seria capaz de ditar o futuro de Gaza. O ataque enfureceu Trump. O Catar é um dos principais aliados dos EUA na região e abriga a maior base militar americana no Oriente Médio.

    É também um local onde os filhos de Trump têm feito negócios lucrativos.

    Trump rejeitou a justificativa de Netanyahu de que o alvo, que não foi atingido, era a liderança do Hamas, e não o Catar. Para Trump, os interesses dos EUA vêm antes dos de Israel.

    Ele não é como o ex-presidente americano Joe Biden, que estava disposto a aceitar danos à posição dos EUA na região como o preço necessário para apoiar Israel. Agora Trump está de volta à capital americana.

    Diplomatas dizem que os americanos sabem que resolver os detalhes é vital e que isso não acontecerá rapidamente.

    O problema é que eles podem não ter tempo suficiente. Os cessar-fogos sempre são violados em seus estágios iniciais.

    Os que sobrevivem tendem a se basear em acordos rígidos, firmados por partes em conflito que decidiram que a melhor opção é fazê-los funcionar. O perigo é que o cessar-fogo em Gaza não tenha essas bases.

    Rachaduras estão surgindo no cessar-fogo apenas 24 horas depois de israelenses e palestinos, por razões muito diferentes, compartilharem alegria e alívio pelo retorno de reféns, prisioneiros e detidos. Até agora, o Hamas devolveu apenas sete dos corpos dos 28 reféns mortos durante o encarceramento.

    A explicação é que é muito difícil encontrar seus túmulos no mar de escombros que Israel criou em Gaza. A paciência de Israel está se esgotando. O destino dos corpos dos reféns se tornará uma questão cada vez maior em Israel se seus restos mortais não forem repatriados. Como primeira resposta, Israel anunciou que, enquanto o Hamas não cumprir suas obrigações, reduzirá pela metade o fluxo de ajuda a Gaza e manterá fechada a passagem de Rafah, fronteira da Faixa de Gaza com o Egito. Bezalel Smotrich, ministro israelense das Finanças de tendência extremista e ultranacionalista que se opõe ao acordo de Gaza, publicou nas redes sociais que "somente a pressão militar traz os reféns de volta". As Forças de Defesa de Israel (FDI) ainda ocupam 53% da Faixa de Gaza.

    Na terça-feira (14), soldados israelenses mataram palestinos que, segundo eles, estavam se aproximando de suas forças.

    A Defesa Civil Palestina em Gaza informou à BBC que sete pessoas foram mortas em dois incidentes. A Cidade de Gaza foi reduzida a destroços REUTERS Pode ser que as FDI ainda estejam seguindo as diretrizes militares que usavam antes do cessar-fogo.

    Elas ordenam que as tropas observem duas linhas imaginárias ao redor de suas posições.

    Se uma delas for cruzada, elas disparam tiros de advertência.

    Se os palestinos continuarem a se aproximar de suas posições e cruzarem uma segunda linha imaginária, as tropas das FDI podem atirar para matar. Um grande problema desse sistema é que os palestinos não sabem onde estão as linhas.

    É um controle de multidão com tiros reais. Quanto ao Hamas, ele está reafirmando seu poder. Seus homens, armados e mascarados, estão de volta às ruas de Gaza.

    O grupo atacou clãs armados rivais, alguns dos quais protegidos pela FDI.

    Circulam vídeos mostrando integrantes do Hamas matando homens ajoelhados e com os olhos vendados, acusados ​​de colaborar com os israelenses. Os vídeos horríveis de execuções extrajudiciais nas ruas enviam uma mensagem a qualquer palestino que queira desafiá-los e ao mundo exterior — a de que o Hamas sobreviveu ao ataque de Israel. O ponto 15 do plano de Trump para Gaza afirma que os EUA "trabalharão com parceiros árabes e internacionais para desenvolver uma Força Internacional de Estabilização (ISF, na sigla em inglês) temporária para ser imediatamente implantada em Gaza". Reunir e implantar essa força será impossível se o cessar-fogo não for sólido, pois potenciais países colaboradores não enviarão suas tropas para usar a força para desarmar o Hamas. O Hamas insinuou que pode abrir mão de algumas armas pesadas, mas não será desarmado.

    O grupo adota uma ideologia de resistência islâmica a Israel e sabe que, sem armas, seus inimigos palestinos buscarão vingança.

    Netanyahu ameaçou que, se ninguém mais o fizer, Israel terminará o serviço.

    As armas do Hamas têm que ser descartadas, disse ele, "pelo caminho fácil ou pelo caminho difícil". Trump proclamou que seu acordo de Gaza, como está, encerrará gerações de conflitos entre árabes e judeus pela terra entre o rio Jordão e o Mar Mediterrâneo.

    Ele também insiste que isso levará a uma paz mais ampla em todo o Oriente Médio. Se ele realmente acredita que a tarefa de pacificar a região está concluída, então está se iludindo.

    A tentativa exige foco constante, trabalho diplomático árduo e a decisão de ambos os lados de fazer sacrifícios e concessões dolorosas.

    Para realmente alcançar a paz, outros sonhos precisam ser abandonados. Ex-presidentes americanos também acreditaram que poderiam promover a paz no Oriente Médio.

    Trump descobrirá que a paz não é feita apenas porque um presidente, por mais poderoso que seja, decide que ela vai acontecer.

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    Fonte: G1